terça-feira, 15 de abril de 2003

Voltei no tempo e fui até o fim do mundo

(ou como foram as coisas em São José do Norte, na terceira etapa do Circuito Gaúcho de Surf AM / 2003)

Quando fiquei sabendo que uma das oito etapas do Circuito Gaúcho Amador deste ano seria em São José do Norte, confesso que fiquei preocupado com o sucesso da empreitada. Mesmo sabendo que a cena surfística no extremo sul do estado está super forte e que no ano passado justamente esta foi uma das melhores etapas do Circuito, não pude deixar de lembrar que minha única experiência com o lugar não era das melhores.

Lembro vagamente a época: por volta de 1985 se não me engano. Inverno rigoroso. Acho que era julho e foi marcado um campeonato de surf no Cassino. Houve um deslocamento em massa para lá e tudo o que consigo me lembrar é que estava muito frio, o mar estava completamente flat e fomos recebidos como estrelas pela galera local. O patrocinador organizou festinhas, ofereceu a estadia e só. Competição que é bom, nada pois não haviam ondas!
A outra lembrança que tinha, era de um filme Super 8 feito pelo Bicudo e o George, surfistas das antigas de Imbé, que volta e meia buscavam alguns lugares "diferentes" para surfar. A onda que aparecia neste filme era uma direita longa, com meio metro mas perfeita, que passava pela câmera e seguia molhes abaixo. O lugar era São José do Norte e, segundo eles, tinha potencial, mas era de difícil acesso, completamente selvagem e muito frio, ou seja, roubada.

E foi com estas lembranças na cabeça que peguei a estrada em direção ao sul do estado. Também é preciso dizer que, além de todo o meu pessimismo ainda estava prevista a entrada de um swell monstro juntamente com uma frente fria daquelas! "Ai, ai, ai, é agora que vou me arrepender até o último fio de cabelo, pensei enquanto curtia a rápida mudança na paisagem, do amarelo queimado nas colinas que rodeiam Porto Alegre para o verde escuro das planícies mais ao sul do estado.
Apesar da distância, a viagem pareceu rápida e ao entardecer da sexta-feira, estavamos chegando em Rio Grande, onde fomos recebidos por André Carneiro, surfista local e um dos líderes da categoría Sênior do Circuito Gaúcho. Assim que chegamos André nos avisou que estava indo a um jantar "no leste", que é a maneira como os locais se referem a São José do Norte. Neste jantar, como viemos a saber mais tarde, foi assumido o compromisso por parte dos políticos locais de trazerem uma etapa do Circuito Brasileiro Supertrials ainda neste ano - provavelmente em outubro - para o Cassino.
Enquanto este jantar acontecia no leste, o irmão do "Broa", apelido de André Carneiro, nos levou para comer uma anchova, prato típico da tradicional "Festa do Mar", que estava acontecendo em Rio Grande.
Mais tarde, todos nos encontramos em casa. Junto com o Broa, chegou o "Boka", surfista e competidor das antigas de Rio Grande e que agora é vereador, já no seu segundo mandato - um dos mais votados na última eleição.

Sábado, primeiro dia de competição e o vento Minuano "a milhões". Frio glacial e muita espectativa no ar. Fui informado que o barquinho do "Seu Sadi", nos largaria perto da margem, mas ainda dentro dágua. Quase tive um filho. Lembrei a todos da minha idade e que já estava se instalando uma gripe neste velho Master. Apesar da gozação fui convincente na minha argumentação e fomos para o leste de balsa.
Ao chegar no pico, surpresa negativa: o palanque ainda estava sendo montado, o que me assustou, pois pelo horário, o evento já devería ter começado. Mas antes de investigar este tipo de assunto eu precisava ver o mar. Estava morrendo de curiosidade para ver como o tal swell monstro seria filtrado pelos molhes. E tive outra surpresa, desta vêz, agradável: encostado nas pedras dos molhes, protegidas do vento, corriam direitas perfeitas de um metro na série e o melhor: sem corrente. Provavelmente ali era o único lugar do estado com condições "civilizadas" de surf. "Ok, tem onda. Agora vamos ver o que está acontecendo que o palanque ainda está sendo montado", pensei. Que nada! Não tinha sido possível montar o segundo andar da estrutura devido aos fortes ventos. E a primeira bateria estava entrando nágua. O show estava começando.

No domingo o mar baixou um pouco (lá fora) e as ondas ficarm muito mais perfeitas nas pedras. Com o vento quase parado haviam momentos em que a comparação com a onda da Silveira era inevitável. O palanque agora estava montado com seus dois andares e o show de surf dentro dágua já havia recomeçado. Quem esteve lá não esquece a onda nota dez que o Márcio Ramos, campeão da Sênior, tirou na bateria final. Ele veio do outside até a beira, dando uma batida atrás da outra, emendando todas as manobras sem dar uma única acelerada ou picada com sua prancha. Perfeito. Nota dez!
Também não posso deixar de comentar o prazer de estar do outro lado, isto é, do lado de dentro. Na final da Master pude aproveitar a perfeição daquelas direitas. Me senti tão bem lá dentro que por alguns instantes esqueci que estava competindo. Pude enterrar de vêz a má impressão que tinha do lugar.

O que se viu nos dois dias de campeonato em São José do Norte foi um clima muito surf. A galera local está fissurada pelo esporte - tanto os surfistas quanto os simpatizantes. A cena local está muito desenvolvida. Patrocinadores, torcida, atletas, enfim, a área de Rio Grande já pode ser considerada um pólo de surf no estado. Da minha parte, posso dizer que voltarei para lá sempre que tiver oportunidade, pois o lugar é fantástico. Aliás, vale lembrar que a distância para se chegar ao molhe leste, partindo de Porto Alegre, é bem menor do que até a Silveira e a temporada de frentes de sul está chegando...

Um abraço

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